domingo, 30 de março de 2008

Leitor

Não. Não adianta você tentar ler estas mal traçadas linhas. Eu não vou me abrir, não vou contar as minhas dores, os meus amores, as minhas tristezas e alegrias. Por isso, sugiro que o mais acertado é você parar por aqui e ir fazer qualquer outra coisa. O dia está bonito? Então vá para a praia, o calçadão ‘tá aí convidando para uma caminhada descompromissada ou reflexiva. Vá para a vida!
Silêncio.
Mas você, hein?!... Eu já não lhe disse que não adianta tentar ler estas linhas, que nada encontrará de interessante? Mas que ser mais teimoso fui encontrar! O que espera nestes parágrafos? Alguma confidência inconfessável? Um texto que fale das desgraças de minha suposta vida? Algum amor pedido, alguma causo engraçado, um fato de infância que marcou a existência? Não adianta, ficarei calada.
Silêncio.
Ok, admito: não gosto de intimidade. Tenho dificuldade de me expressar, de falar o que sinto e vivo, por isso, vá tirando seu cavalinho da chuva, não dará certo. Desista enquanto ainda dá tempo, não perca o seu tempo lendo este texto. Não matarei sua curiosidade. Não deixarei que penetre tal qual um ladrão que adentra na calada da noite o quarto onde durmo.
Tive um professor que sempre falava da necessidade de se expressar através das palavras. Que elas, as palavras, podem ser uma carta de alforria. Não sei. Sinceramente, não sei se a palavra pode me libertar. Às vezes, só às vezes, acho que ela me prende a um mundo concreto. Que materializa a minha emoção, e isso é assustador, porque enquanto a emoção está no campo do abstrato, tudo é fantasia, tudo é imponderável. Mas a partir do momento que ela se concretiza, ah...isso me assusta, tenho que confessar.
Agora pára. Não adianta. Já falei muito. Vá embora, caia na vida, me deixe em paz!
Silêncio.
Estive pensando.... pensando em várias coisas e inclusive em você, que está aí do outro lado tentando ler este texto que teimosamente não quero escrever. Mas não consigo me desvencilhar dos seus olhos, que, imagino, percorrem esta folha branca com letras pretas. Que você é um ser teimoso, não tenho a menor dúvida, mas o que faz uma pessoa insistir em ler algo que o escritor não quer escrever? Fico imaginando como você pode ser, o que faz, se é homem ou mulher. Você sabe mais de mim do que eu sei de você. Isso me assusta.
Ok, admito que sou um ser humano assustado, mas não muito. Tenho feito o exercício de me atirar na vida, na maioria das vezes consigo. Mas há dias, em que o sol interior está envolto em nuvens de tempestade, que fica difícil sair da cama. Saio, mas é difícil, admito.
Silêncio.
Seu silêncio é algo que me incomoda profundamente. Não consigo escutá-lo, e o meu monólogo interior é enfadonho, e fico a imaginar se não acha o mesmo.
Vá embora! Deixe-me em paz! Você está me fazendo prisioneiro ao continuar lendo estas letras impressas no papel branco. Não consigo parar. Vou parar. Estou parando. Desisto. Ponto final.

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